A DEUSA DA HIPOCRISIA

RESPONDA RAPIDAMENTE:
A HIPOCRISIA TEM DONO?
VAMOS LÁ,
TEM OU NÃO TEM?
NÃO SABE? CRIE UMA,
QUALQUER UMA.
MESMO SEM SABER,
AINDA ASSIM PODE EXERCÊ-LA.
SEJAMOS RAZOÁVEIS,
BUSQUEMOS SUAS ORIGENS.
NÃO SERIA ELA A MAIOR
DAS DEUSAS PAGÃS?
QUEM SABE, AINDA,
PRINCÍPIO PRIMEIRO DA CIVILIZAÇÃO,
ESTRUTURAL COLUNA
DAS MUITAS SOCIEDADES.
MUSA DELIRANTE,
A INTERAÇÃO DE ARTEMIS COM AFRODITE.
ADORADA POR NOBRES E PLEBEUS.
DEUSA OCULTA, INVISÍVEL E INDIZÍVEL.
PROTETORA DAS TRAIÇÕES ASTUCIOSAS
E DAS SEDUÇÕES VÁZIAS.
BELA DIVA.
LINDA COMO OS URUBUS
DEVEM ACHAR A CARNIÇA.
IMPONENTE.
ACIMA DAS IRONIAS
E ATÉ MESMO DOS SARCASMOS.
TRIUNFANTE,
VIVE A SE FINGIR DE PUDICA,
EMBORA PROSTITUTA.
PODEROSA.
TRANSMUTA A PRUDÊNCIA
E A SENSATEZ EM CORRUPÇÃO.
IMPALPÁVEL,
MAS TÃO VIVA NA SORDIDEZ HUMANA...
FALSA.
ENGANA OS TOLOS,
FAZENDO A PAIXÃO PARECER AMOR.
NENHUMA SINCERIDADE.
PÉRFIDA,
OCULTA EM BEIJOS
O DESEJO DE ESTAPEAR.
SIMULA AUXÍLIO
QUANDO EM VERDADE
QUER SE APROPRIAR.
PINTA COM SUTILEZAS EPICURÍSTICAS
O QUE SERIA MERAMENTE VULGAR.
SEMPRE PRONTA ÀS LÁGRIMAS
PARA ASSALTAR A PIEDADE ALHEIA.
DESONESTA ,
MAS FINGINDO
PARA EXPLORAR
O REALMENTE HONESTO.
DELICADA
COMO SÃO DELICADOS
OS ORANGOTANGOS NO CIO.
AFETIVA
EM SUAS CARÍCIAS INTERESSEIRAS,
A ESCONDER SUAS GARRAS E PRESAS.
FERA AGRESSIVA
DISFARÇADA DE DÓCIL GAZELA.
REJEITADA PELOS ORADORES
EM SEUS DISCURSOS,
PORÉM PROPRIETÁRIA
QUE SE FINGE DE INQUILINA
INTIMAMENTE INSTALADA
NO CORAÇÃO DOS SEUS CRENTES.

GILBERTO BRANDÃO MARCON
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS





O PRAZER DE VIVER




Adormecer do sol diário.
Pontilham luzes no horizonte longínquo.
Os sons imperativos do cotidiano dão lugar
aos murmúrios da natureza.
A tensão nervosa das emoções dá lugar
a uma suave sensualidade.
O calor incômodo do transcorrer do dia
dá lugar à brisa fria
que cria mornidão agradável.
O ar mais rarefeito
adentra com maior facilidade
os pulmões, alimentando o coração.
Uma satisfação, a principio oculta,
quer vir à tona, quer desabrochar em vida.
Sentimentos divididos se organizam
num seguro vivenciar sensorial.
Corpo e espirito parecem estar tão próximos...
Aconchego da alma no casulo corporal.
As sobras do crepúsculo tingem
de um sombrear dourado toda a paisagem.
Abandona-se à individualidade para se perder
numa confortável impessoalidade.
Finge perder-se de si, mas é posseiro
da própria integridade.
Sente afinidade com o universo sem ser
seu dono ou ter sua posse.
Estranha liberdade.
Identifica-se com os sonhadores
que se hospedam nas suas torres de marfim.
Nuvens rarefeitas dão um tom pessoal
à crepuscular pintura celeste.
O coração pulsa forte, parece dominado
por ingênua felicidade, por estar vivo.
O lado impalpável do ser se confraterniza
com sua face tangível.
Santificado suor denuncia a inquietação
das correntes sangüíneas, sente-se saudável.
A epiderme sente o afeto da harmonia do momento,
suaves caricias da natureza.
Os músculos preguiçosos
descansam sobre a estrutura óssea do corpo.
Abandona toda memória
para viver exclusivamente o presente.
Despoja-se das responsabilidades
e das velhas culpas.
Torna-se leve, identifica-se com a pluma
a planar nas correntes de vento.
Cercado por silêncio particular
parece ouvir sonora voz
a contar-lhe íntimos segredos.
Nunca a intimidade, foi tão integral.
Desapareceram as dúvidas,
torna-se dono de certezas.
Nasce a noite, a principio
apenas espreita no horizonte,
para depois abrir o seu manto.
Tecidos de seda, de eterelidade sensual,
de sedutora transparência.
O prazer é saudável, é reconhecimento de vida.
Desejava tocar com os lábios as faces da noite.
Envolve-se pelo conjunto de tudo,
passa a fazer parte, integrar-se.
Mergulha em si mesmo, para descobrir o todo
que o cerca e está feliz por isto.


Gilberto Brandão Marcon
Todos os Direitos Reservados
O ETERNO DESERTO DE MIM



Perdido no deserto,

esgotado em forças,

entre a espada e o punhal.

Em busca da voz da consciência

e o silêncio nada diz,

apenas o corpo acusa a profunda exaustão.

O espírito curva-se, não aos adversários,

mas ao temor de ter perdido o próprio ideal,

ao medo de ter perdido o afeto do Divino.

Esgotado em forças,

sente a aproximação da batalha final.

E como enfrentá-la sem forças?

Após tantos séculos,

até mesmo um velho leão

haverá de ter o destino do cordeiro ?

Não lamenta por si.

Não há o que lamentar.

A alma nascida na guerra

teme mais a eternidade

do que a própria morte.

Sei somente que está repleto de dor,

quer evitá-la a todo custo

e isto o faz escravo do homem.

O espírito esconde-se atrás do corpo,

tem vergonha da covardia,

mas a coragem virou sinônimo de dor.

Dor que nasce no corpo

e depois parece impregnar a alma.

Não há uma explicação plausível,

apenas uma enorme solidão,

um sentimento de eterno degredado.

Um desejo de sorrir ao Criador

e clamar por sua piedade absoluta,

num ato de desistência,

numa derrota que já nada custa,

numa vitória que já nada vale.

Não é a tristeza que dói,

mas a inexorável perda da esperança,

da crença no impossível.

O velho matou o menino.

Talvez esteja farto de tanto buscá-lo,

talvez não tenha tido outra opção

e isto o irrita tanto

quando sabe ser necessário

o dever, o eterno dever,

a dívida impagável, a sigilosa culpa,

carrasca que se fez companheira,

a tortura invisível.

Perdido no deserto,

um deserto que vai em si,

um deserto que

um dia almejou ser jardim,

mas as flores não brotaram.

Os frutos preferiam outros lugares.

Não é piedade de si,

mas profundo desgosto.

O punhal venceu a espada,

penetrou o coração.

Fonte de si, fonte da vida,

da vida que se perde,

como que a areia fina

que vai entre dedos.

Nem olhos, nem ouvidos.

E a boca está vazia de palavras.

Por dias melhores,

pela oração que não sabe,

pelo destino que não quis.

Por todo o esgotamento da luta.

Tudo convertido numa

única e última esperança:

a da almejada paz.

05/02/2007

Gilberto Brandão Marcon

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Àudio de Rosany Costa que presenteou-me com sua interpretação:

http://www.rosanycosta.com.br/amigos/292-o-eterno-deserto-de-mim.html




RESSURREIÇÃO



Sagradas memórias, traços,

Linhas reescritas em desenhos,

No coração lágrimas de chuva.


Gilberto Brandão Marcon

Todos os Direitos Reservados



CONSOLAÇÃO



Pai, Senhor do Infinito,
aconchega-me em Teu colo santo,
para que minhas angústias
não me tornem amargo.
Ceda-me uma réstia de Teu olhar
de eterna esperança,
substituindo, assim ,
as lágrimas de desespero,
pela pacífica humildade
que nos traz a sabedoria.
Permita-me apreender
a conversão do ódio em amor.
E assim ser semente
que faz brotar vida em meio à aridez.
Ajuda-me a amadurecer
os meus sentimentos,
permitindo que minhas mágoas
sejam convertidas em adubo fértil
para a semente do bem.
Pai, ensina-me um pouco
da Tua paciência bendita.
Acompanha-me neste meu engatinhar
para o Teu caminho.
Com Tua força suave
afasta de mim o fantasma do medo,
permitindo brotar em minha memória
as lições da eternidade,
fazendo que o meu casulo corporal
seja apenas ninho e morada
de uma ave chamada liberdade.
Seja ela alma etérea a habitar
o nervo ótico de meus limitados olhos,
dando-me olhos de ver,
tendo visão para desvendar
o quão profundo é o universo.
E que a imagem deste infinito oceano
de astros celestes
tenha o dom do consolo,
realizando o milagre de resgatar
a paz perdida, inundando de serenidade
a brutalidade competitiva do cotidiano.
E que neste pacificar-se
eu encontre a dádiva da prece.
Que a prece transforme-se
em oração que fala aos Teus ouvidos.
Que Teu socorro seja barreira eficaz
contra a clava e a espada.
Que mesmo sozinho, eu esteja Contigo.
Que mesmo longe de tudo,
ainda esteja perto de Ti.
Traz-me o afeto do congregar
das presenças fraternas.
Tuas luzes, lumes sagrados
a iluminar o escuro das trevas.
Trevas dos cérebros e corações rebeldes
à Tua Lei e ao Teu Amor.
Pai, ensina-me a transformar
minha obstinação em perseverança
na tua busca.
Que as energias vitais
do Afeto Divino venham me nutrir,
por entre sorrisos e lágrimas,
vitórias e derrotas,
criando em mim serena e enérgica vontade,
direcionando o meu livre arbítrio
para congregar-me em Tua obra.

Gilberto Brandão Marcon - Todos os Direitos Reservados

Audio:

http://recantodasletras.uol.com.br/oracoes/1546974